Um balão


Um balão tem fome de ar
Não é da seita do ventre liso
E das formas rectilíneas.
À falta de asas,
Come porções de infinito,
E voa com estômago cheio.
Os que entorpecidos,
Por uma estética alheia,
Negam tal apetite,
Ficam com aspecto mirrado
E palpável impotência.
A não ser que a golfadas de ar
Recuperem forma e inocência.
Dirão, um balão é frágil,
Uma iminente promessa de explosão,
 Suspenso de trôpega altivez,
Eu penso:
- O defeito assinalado
É concentrada ilusão
 Á vida está plasmado
Como gémeo irmão

O poeta



Tem trabalho de garimpeiro:
 Procura entre os grãos de areia
 Uma esquiva pepita de ouro.
 Poderão outros referir
 Tem a maldição do brilho,
  A febre da beleza.
 Não deixará de ter razão,
 Quem prosaicamente diagnostica:
 Miopia face ao pragmático;
 Dificuldades de locomoção, 
 Com especificidade ao real.
 Todos acertam,
 Ninguém está correcto.
 Explicação ou ponto de vista
 Tombaria na teia da definição,
  Por isso faço greve.
 Frente a mim, uma folha branca
 Com a seguinte inscrição: O poeta…

Ciclo



As espigas abrem-se,
Deixam que o sol lhes beije a pele,
Calorosa e firmemente.
Maturam
                             Com o silêncio do campo                               
E pródigas carícias de luz,
Em anseio
Pela colheita nupcial.

A exuberância sedutora,
Antecede autista e Inconsciente,
O estado pós coital
De canas amputadas,
De pureza roubada.
O fim da inocência,
Sob bárbara superfície,
Esconde a florida
Roda da vida.